SAPO
09 de setembro de 2011, 13:09
Análise/"Rentrée" política:
"Vai ser um ano de estabilidade governativa"
O novo ano político que arrancou esta semana será crucial para o executivo de Passos Coelho. O SAPO fez uma ronda por vários politólogos para saber quais os desafios que o governo terá de enfrentar, e qual será o papel do maior partido da oposição na era pós-Sócrates.
A completar três meses de governação, o executivo de Passos tem um novo ano político pela frente. Depois dos novos impostos anunciados há semanas, o governo diz que a prioridade continua a ser o controlo do défice orçamental em paralelo com o crescimento económico.
Com um memorando exigente por cumprir, poderá Passos ir além da troika?
"O governo atual de Portugal é a troika. Não há muita margem de manobra. Atualmente a política joga-se em Paris e Berlim", refere Adelino Maltez ao SAPO. Mas, na opinião de Ana Belchior, docente e investigadora em Ciência Política no ISCTE-IUL, a ideia de que o memorando dita as regras do jogo é "enganadora". "Existe uma margem de flexibilidade na implementação das medidas que está aliás a ser usada pelo governo", explica.
"Ainda há duas incógnitas que só se vão descobrir ao longo do ano político: o que é que o governo vai fazer em termos de políticas públicas, como vai implementar e onde vai poder ir mais além", são o desafios que o politólogo Carlos Jalali antecipa para o novo ano político. "Vai ser um ano de estabilidade governativa", remata o professor da Universidade de Aveiro.
Próximos meses serão decisivos
Na opinião do investigador, ainda persiste o benefício da dúvida em relação ao executivo. "O estado de graça foi extremamente reduzido, não houve sequer lua de mel, mas há a expectativa de que as coisas corram bem. Os cidadãos ainda estão a tentar perceber o que vem aí", refere. "A política a sério chega dentro de um mês, dois meses", partilha Adelino Maltez.
Para Ana Belchior o cenário é bem diferente: "Três aumentos sucessivos de impostos num espaço tão curto de tempo levaria inevitavelmente ao fim de qualquer estado de graça". Mas considera que este fator é mais efeito do que causa.
"O período de satisfação com o desempenho dos governos tenda a ser progressivamente encurtado. Em especial se do ponto de vista do desempenho político se mantiverem os mesmos procedimentos e atitudes, como o não cumprimento das promessas eleitorais, como foi o caso deste governo em relação ao aumento de impostos", explica ao SAPO.
Jalali considera apenas que o governo "está a pagar o preço das expectativas que gerou". Passos Coelho ainda se está a debater com a máquina governativa, centralizada e pesada, que existe em Portugal". E isto é tanto mais verdade quando na sua equipa "há muitos ministros sem experiência governativa", conclui.
Sobre possíveis saídas governativas, Adelino Maltez admite a possibilidade da equipa ministerial poder vir a sofrer baixas nos próximos meses. "Passos pode mudar os treinadores", refere fazendo o paralelismo futebolístico com um possível saída de Vítor Gaspar, ministro das Finanças e/ou Álvaro Pereira, da pasta da Economia.
"É a zona que está mais dependente do fator internacional, e portanto, não é de admirar que surjam mudanças mesmo antes so Natal", explica ao SAPO.
Jalali alerta que ainda é prematuro pensar em saídas mas é "inevitável que a equipa tal como está hoje não chegue ao fim do mandato". Mas, a sair Vítor Gaspar ou a Álvaro Pereira "seria mais por uma estratégica económica desadequada que gerasse pressão nacional, do que propriamente pelo fator internacional", explica o politólogo.
O professor prefere refletir sobre outros dados: "nenhum governo de coligação durou uma legislatura completa, mas este governo vai ser diferente", acredita.
"PS à procura da própria voz no pós-Sócrates"
Numa altura em que o PS só agora se começa agora a organizar (o Congresso Socialista entre 9 e 11 de setembro é o ponto de partida) José Seguro tem de conseguir fazer o partido avançar na era pós-Sócrates. "O PS está embalada no interregno, no excesso socrático e até agora só tem atirado barro à parede", considera Adelino Maltez.
Carlos Jalali antecipa um ano desafiante para os socialistas. "Os socialistas estão a tentar encontrar a sua própria voz no pós-Sócrates. Até que ponto o PS de Seguro se vai relacionar com o governo, até que ponto se demarca e em que pontos de demarca, até que ponto é um parceiro, ainda são tudo incógnitas", afirma.
O secretário-geral do PS apresentou na semana passada propostas para "introduzir justiça na repartição dos sacrifícios", entre as quais o englobamento dos rendimentos de capital na sobretaxa extraordinária de IRS para 2011, e a criação de taxa adicional de IRC de 3,5% para as empresas com lucros superiores a 2 milhões de Euros, num sinal de que não vai estar apenas a fiscalizar o governo de Passos.
"O PS perdeu um milhão de eleitores para o PSD. Vai concorrer no centro sociológico do país", considera Adelino Maltez.
"A política terá interesse em Portugal quando tocar a existência política individual, e para isso é preciso a oposição. Ao longo destes anos tem havido mau governo porque não há oposição, nem boa nem má", acrescenta.
"Adiamento da redução da TSU é sinal de prudência"
Apesar de se multiplicarem os anúncios de mais austeridade, a redução da Taxa Social Única (TSU), uma das medidas mais controversas acordadas com a troika, continua sem ser formalizada.
Há uns meses atrás, o ministro das Finanças, Vítor Gaspar, afirmou que o governo estaria disponível para falar com os parceiros sociais nacionais e internacionais com vista a definir um modelo para a redução da TSU. Em discussão há diferentes propostas, entre elas, a redução da TSU com base na criação de emprego líquido, ou seja, a diferença entre o emprego criado e o destruído.
Certo é que a percentagem da redução da contribuição das empresas à segurança social por cada trabalhador, tem sido um assunto constantemente adiado pelo governo. Para Carlos Jalali este é apenas um sinal de prudência do governo. "Está a ganhar tempo, a estudar bem a questão, até porque a pressão é dupla: por um lado fazer crescer a economia, mas por outro, controlar o défice orçamental e esta segunda tem muita força", explica.
Este é um tema particularmente sensível na medida em que terá de existir necessariamente uma compensação, ou seja, aumentar os encargos sobre os trabalhadores. No final de maio, Daniel Bessa, diretor geral da COTEC explicava ao SAPO que uma forma de evitar a diminuição da TSU e ainda assim estimular a competitividade, seria pedir a cada português que trabalhasse mais quatro horas por dia recebendo o mesmo. Este esforço, segundo o economista, traduzir-se-ia num aumento de 10% da produtividade nacional.
@Catarina Osório
*Este artigo foi escrito ao abrigo do novo acordo ortográfico.*
SAPONOTÍCIAS
Daniel Bessa
Diretor Geral da COTEC
Trabalhar mais quatro horas e receber o mesmo
Daniel Bessa, diretor geral da COTEC defende que:
seria de convidade cada português a trabalhar mais quatro horas por dia recebendo o mesmo... traduzia-se num aumento de 10% da produtividade nacional